Hiper Disney: José Pacheco Pereira costuma dizer que, entre tudo o que leu na sua juventude, nada o “fez” tanto como a revista Cavaleiro Andante. De igual forma, eu não seria o mesmo sem todas as publicações da Disney, da Turma da Mônica e doutras personagens que enchiam os quiosques e papelarias nas décadas de 80 e 90. Para representá-las, menciono o Hiper Disney, uma revista lançada em 1989 que se diferenciava dos outros periódicos da Abril Morumbi por caraterísticas como o tamanho, a encadernação (as lombadas das edições de cada ano formavam uma imagem ao juntarem-se) ou o traço dos desenhos provenientes da escola italiana da Disney, numa altura em que a produção brasileira era ainda a mais conhecida dos miúdos portugueses. As histórias da revista possuíam também argumentos de maior arrojo, com vários finais alternativos ou experiências como recontar Os Miseráveis com as personagens da Disney. Por volta de 1994, Hiper Disney era já apenas uma compilação de histórias antigas semelhante a outras existentes no mercado.
Visão: A partir de 1996, li e guardei a newsmagazine dirigida por Cáceres Monteiro e pelos seus sucessores, dando origem a uma coleção que com o passar do tempo se tornou um monstro incontrolável. Quando a pandemia chegou, em março de 2020, aproveitei para deixar de comprar a Visão, devido a razões como cansaço, falta de espaço em casa e a perda da “mística” alcançada pela revista nas suas primeiras duas décadas. O jornalista Luís Ribeiro recordou nas redes sociais o apogeu e a decadência (ainda em curso) da Visão, pelo que me basta salientar a forma como a publicação soube compreender os interesses e preocupações da classe média portuguesa e oferecer-lhe aquilo que desejava ler. Tal como o seu antecessor, O Jornal, a Visão tinha uma perspetiva do mundo que a levava por vezes a tomar posição (a favor da despenalização do aborto, contra a invasão do Iraque, etc.), mas sem esfregá-la na cara do leitor e dando-lhe informação para pensar por si próprio, para além de colunistas como António Lobo Antunes e Ricardo Araújo Pereira. Espero que não seja necessário em breve que eu recue para aderir a uma campanha destinada a assegurar a sobrevivência da Visão.
20 Anos: Subsistem poucas memórias da versão lusa da revista francesa 20 Ans, dirigida por Paula Ribeiro e publicada mensalmente entre 1997 e 1998. Com 13 anos, eu acedia à revista porque a minha irmã a comprava e, tendo em conta a faixa etária referida no título, vários artigos passavam-me ao lado, mas adorava o grafismo, a irreverência dos conteúdos, as pranchas do Loverboy da autoria de Marte (Marcos Farrajota) e João Fazenda e sobretudo os “testes” e outros artigos humorísticos escritos pelos então vintões Miguel Góis e Ricardo Araújo Pereira. A curta vida da publicação dá a entender que teve dificuldades em encontrar os jovens a que se dirigia.
Público: Muitas pessoas que cresceram nos anos 90 e 00 aprenderam a olhar o mundo com o Público. Sob a direção de Vicente Jorge Silva, José Manuel Fernandes ou Bárbara Reis, o diário da Sonae apresentava uma vasta cobertura da atualidade nacional e internacional e um conjunto de secções e conteúdos que ficaram ligados à identidade do periódico: a revista dominical Pública, o Bartoon de Luís Afonso (hoje em dia, o barman mostra a amargura cética dos comerciantes há muito tempo no negócio), as Histórias de Amor de Miguel, as tiras de Calvin & Hobbes, os suplementos culturais, O Inimigo Público, as colunas de Eduardo Cintra Torres, Miguel Sousa Tavares, Eduardo Prado Coelho ou Vasco Pulido Valente, a divulgação de BD e ilustração, etc. Até o quadrado “O Público Errou” era saudavelmente humilde. O que mudou no jornal nos últimos anos? O mesmo que em todo o lado, imagino: o tempo encolheu.
Premiere: Surgida em 1999, a edição portuguesa desta revista de cinema do grupo Hachette não tinha nada de muito original, mas era suficientemente forte para abafar quem lhe tentasse fazer concorrência, como a efémera Primeiras Imagens. As críticas aos filmes disponíveis nas salas e em VHS/DVD, as antevisões das próximas estreias e algumas entrevistas e reportagens sobre o cinema português tornavam a Premiere obrigatória para os cinéfilos que lançavam blogues dedicados à sétima arte na primeira década deste século. Em 2011, a viabilidade comercial de revistas de cinema em papel era já coisa do passado em Portugal.
Observador: O jornal digital de Rui Ramos e José Manuel Fernandes, entre outros, é eficiente no fornecimento daquelas notícias publicadas às 17.57 que já estão desatualizadas às 18.43. Essa rapidez de resposta distingue o Observador da ingenuidade de outros órgãos de imprensa politicamente orientados e atrai algumas pessoas exteriores à linha ideológica definida por Ramos e transmitida numa linguagem mais próxima das massas pelos restantes comentadores. A secção de opinião do jornal serve ainda para aprendermos a distinguir humoristas de quem podemos discordar mas têm sempre piada (Zé Diogo Quintela) de outros que se tornaram os maiores da aldeia deles (Tiago Dores). Os anuários em papel reúnem os ensaios e reportagens mais duráveis e alguns exemplos do combate cultural do Observador que farão dele um objeto de estudo fascinante para os futuros historiadores dos media.
JN História: Um projeto muito pessoal do jornalista Pedro Olavo Simões, o qual produz, em parceria com vários investigadores, uma revista de divulgação histórica que já completou oito anos de publicação, embora atualmente cada número possa ser o último, devido à situação no grupo Global Media. Visualmente atrativa e sensível aos estímulos noticiosos, a JN História consegue evitar a superficialidade sem ser exaustiva, servindo de elo de ligação entre a academia e o “grande público” interessado por temas históricos. As entrevistas a historiadores, selecionados com o cuidado de repartir a atenção pelas várias universidades do país, resultam em conversas muito interessantes sobre o passado e o presente e mostram o valor das principais figuras da historiografia lusa. É assim que se divulga a História, não com vídeos feitos às três pancadas e publicados no Tik Tok.